Estudantes envolvidos com a Universidade – o curioso caso do GBU Vila Real
O Wirlley nasceu no Brasil mas está em Portugal desde criança tendo residido durante a maior parte da vida na região de Trás os Montes, primeiro em Vila Real e depois em Chaves. Estuda na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) e tem liderado o grupo do GBU em Vila Real.
O Guilherme Lino é estudante do primeiro ano de Ciências da Comunicação no IADE em Lisboa e entrevistou o Wirlley para nos dar a conhecer melhor o GBU de Vila Real e contar-nos como este grupo teve recentemente uma iniciativa visível, com repercussões surpreendentes, no espaço da UTAD. Esta iniciativa levou à reativação de uma paragem de autocarros que beneficia muito a comunidade estudantil e provocou também a curiosidade da equipa da reitoria da UTAD que quis conhecer o GBU e o seu líder.
Lê em seguida a entrevista completa!
Guilherme Lino – Olá Wirlley! Podes dizer-nos qual é a tua área de estudos na UTAD (Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro) e como começou o teu envolvimento com o GBU?
Wirlley – Eu estou a terminar a Licenciatura em Línguas, Literaturas e Culturas na Escola de Ciências Humanas e Sociais da UTAD. Agora vou ingressar no Mestrado de Ensino de Português e Inglês para 3º Ciclo e Secundário, também na UTAD. O meu envolvimento com o GBU começou tecnicamente antes de ingressar no curso. Conhecia uma pessoa da igreja cuja irmã tinha estudado na UTAD e participado no GBU e que me levou a estabelecer contacto com o anterior líder do GBU em Vila Real, o Arsénio, ainda antes de eu iniciar o ano letivo como caloiro. O GBU fez parte da minha vida na UTAD desde a primeira semana.
GL – Como é que descreverias hoje em dia o grupo local do GBU em Vila Real? Qual tem sido a importância deste grupo no teu percurso académico?
W – Descreveria como sendo diverso, porque agora nós temos vários membros, pessoal de diferentes proveniências e nacionalidades, principalmente estudantes africanos – e graças a Deus por eles! Temos um grupo diverso, com pessoas com feitios e culturas variadas. Tem sido uma bênção passar até por choques culturais e conseguir conciliar estas diferentes sensibilidades culturais. No meio disto, podemos entender que não é a cultura humana que nos junta, mas é a cultura que vem dos céus que nos liga mesmo — unidade em Cristo, diversidade no resto. Pesando todas as coisas, o GBU tem sido muito importante no meu percurso académico. Nos primeiros dois anos talvez tenha sido um pouco mais frustrante, pois eu dava ideias para o GBU mas eu próprio não conseguia colocá-las em prática. Agora no terceiro ano tem sido muito bom do ponto de vista pessoal. Consegui sair da minha zona de conforto, porque sou um bocado introvertido e tímido, mas pude amadurecer com a experiência de liderar o grupo. E agora até tenho vontade de ficar no GBU para o resto da vida, embora tenha consciência de que é uma etapa. Este ano letivo ajudou-me a nível da maturidade na caminhada com Cristo.
GL – Não diria que és uma pessoa introvertida, pois chegaste a esta entrevista muito à vontade.
W – É como digo, há uns anos atrás era bastante introvertido, mas Deus vai trabalhando em nós e tornou um introvertido em alguém mais extrovertido.
GL – No GBU os estudantes são incentivados a conectar a fé às necessidades do espaço académico. Queremos estar de olhos abertos e, na medida das nossas possibilidades, responder aos problemas que identificamos na Universidade. O grupo de Vila Real fez isto de uma forma muito concreta, identificando um problema e agindo para lhe dar resposta. Podes explicar-nos que problema era esse e como é que vocês o identificaram?
W – No semestre passado nós fizemos um abaixo-assinado para reativar a paragem de autocarro perto do pólo 1, de Ciências Humanas e Sociais onde tenho aulas. Esta paragem já estava inativa há vários anos, desde antes de eu entrar na Universidade. Isto era grave, por se tratar da única paragem coberta perto do pólo 1. No tempo de chuva, o pessoal ao sair do pólo 1 tinha de subir um morro mal iluminado, e perigoso à noite, passar por uma zona de estacionamento e caminhar ainda mais um bocado para chegar à paragem de autocarro mais próxima que, ainda por cima, era descoberta! Se estivesse a chover era uma situação muito desconfortável.
Eu estava a orar a Deus desde o início do ano letivo para que aparecesse uma oportunidade de levar o GBU até à Universidade, por meio de alguma iniciativa concreta que também ajudasse a tornar o GBU conhecido. Tinha esse objetivo para este ano letivo. Ora no final de outubro estávamos a falar sobre esta paragem de autocarro e a notar a quantidade de pessoas que se queixavam, até mesmo professores. Há muita gente que se desloca ao pólo 1, não só os estudantes desta Escola mas também outros alunos da UTAD. E então percebemos que este assunto era uma oportunidade de servir a Universidade – como costumo dizer, “lavar os pés à Universidade”. Era uma oportunidade de ser uma bênção para os nossos colegas num assunto muito prático, pois também é isso que somos chamados a fazer como cristãos. Então organizámos o abaixo-assinado, a minha diretora de curso deu uma ajuda, falámos com representantes de outros núcleos da Universidade e também com a Associação Académica, para conseguirmos ter mais força nesta iniciativa. E conseguimos recolher quase 1700 assinaturas de alunos até final de novembro. Nunca falei com tanta gente como durante essas semanas! Graças a Deus conseguimos chegar a este número que corresponde aproximadamente a 20% da população que compõe a UTAD. Depois os professores também organizaram um abaixo-assinado para apoiar o nosso, e isso também veio ajudar.
GL – E qual foi o desfecho desse processo?
Bom, a paragem demorou algum tempo a ser reativada, mas no início de abril isso aconteceu finalmente e agora já está ao serviço dos estudantes. Adicionalmente, no mesmo período, foi também reativada uma outra paragem dentro da Universidade, que também beneficia a população estudantil.
GL – Como consequência do envolvimento do GBU neste processo, tu próprio, na qualidade de líder do GBU local, acabaste por ser chamado para reuniões com o vice-reitor e, depois, com o reitor da UTAD. Como é que foram essas reuniões?
W – Primeiro tive a informação de que o Vice-Reitor, tendo conhecimento de que o GBU tinha estado a mobilizar as pessoas da UTAD para o abaixo-assinado, tinha interesse em conhecer o líder do GBU. Depois de alguns meses em que houve dificuldade no agendamento da reunião, ela concretizou-se mesmo no início de março. Nessa conversa, o interesse do Vice-Reitor foi sobretudo entender qual o tipo de contacto/relação entre o GBU e as Universidades, em específico. Eu expliquei, do pouco que sabia, como é que esse contacto acontece noutras universidades. Depois ele solicitou uma carta de apresentação formal do GBU, algo que eu e o Manuel Rainho, Secretário-Geral, preparámos em conjunto e entregámos no início de abril. Com essa carta em mãos, o Vice-Reitor solicitou também uma reunião diretamente com o Reitor da UTAD. No passado dia 17 de maio dirigi-me à reitoria para ter essa reunião. Pensava que me iria encontrar com o Vice-Reitor, que já conhecia, e com o Reitor. Só que quando cheguei à reitoria foi-me dito que o encontro seria com toda a equipa da reitoria… Nem imaginas o meu nervosismo! Andei 10 minutos naquela sala de um lado para o outro a pensar “eish! Ai não, ai não!” Mas também estava em oração e, com a ajuda do Espírito Santo, consegui falar calmamente.
Eles queriam saber melhor qual é a natureza do envolvimento do GBU na UTAD e esclarecer que não haveria favoritismo para o GBU dentro desta Universidade, mas que, como acontece com outros grupos oficiais, podem disponibilizar espaços para alguma iniciativa que queiramos fazer de tema geral e de interesse geral para os alunos. Portanto, a reunião acabou por ser, sobretudo, uma demonstração de disponibilidade para colaborar com o GBU dentro de certos parâmetros.
Foi muito bom ver que o objetivo inicial de tornar o GBU mais conhecido na Universidade durante este ano letivo foi de facto concretizado, embora não da maneira que pensei inicialmente (diretamente junto dos colegas) mas, no caso, junto da mais alta estrutura oficial da Universidade. E assim, no próximo ano letivo, poderemos ter algum tipo de palestras/plenárias na UTAD.
GL – Quais é que tu achas que são as motivações e preocupações dos responsáveis pela UTAD nesse contacto com o GBU?
W – As preocupações da reitoria prendem-se com a questão do proselitismo, sobretudo se for feito em grande escala, de tal modo que pareça ser promovido pela própria UTAD, como se esta fosse parcial em relação a alguma profissão de fé. Eles estão preocupados em manter a neutralidade neste aspeto. Também em relação às questões políticas, uma vez que há o receio de que, por meio de uma religião, se acabe por politizar a Universidade. Quanto às motivações, creio que procuram chegar a um entendimento para podermos coexistir num espaço com várias cosmovisões, várias profissões de fé, etc. A UTAD é uma Universidade que tem crescido recentemente, tem mais alunos, e tem também subido nos rankings. A reitoria quer manter o prestígio e um ambiente de harmonia.
GL – E, finalmente, como é que tu explicarias hoje, depois de passares por toda esta experiência, a ligação que pode (ou deve) existir entre a fé cristã e a ação dos estudantes cristãos face aos problemas concretos da Universidade?
Sermos cristãos molda toda a nossa vida. Ainda agora estive na Bênção de Finalistas do GBU aqui no norte e ouvi duas frases de que gostei muito. Uma foi esta: “eu não sou um estudante cristão, mas sim um cristão que é estudante”. E a outra frase é: “deixar que Jesus faça parte de todas as partes da nossa vida.” Isto implica que, em muitas áreas, eu ajo diferente dos outros por causa da diferença que Cristo faz em mim. No contexto universitário isto implica que nós não estamos na Universidade apenas para receber, mas também para ser sal e luz naquele contexto. É verdade que é um espaço onde concorrem muitas ideologias contrastantes com o Evangelho, mas, bem firmes nas nossas convicções, podemos estar lá de coração aberto para o que Cristo quer fazer em nós e através de nós naquele espaço. Os desafios que ali se vivem são muitos, mas é no meio desses desafios que somos chamados a levar a alegria da salvação e a paz que excede o entendimento para dentro da Universidade.
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