Um estudante cristão envolvido com a universidade – entrevista a André Brito

Um estudante cristão envolvido com a universidade – entrevista a André Brito

Para uma nova rubrica do nosso blog, Uma conversa com a universidade, pedimos a uma estudante de Jornalismo, Priscila Rodrigues, que se deslocasse até à Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa para entrevistar André Brito, um cristão e estudante de Direito envolvido nos orgão da faculdade. O André está atualmente no Conselho de Escola da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, no Senado da Universidade de Lisboa e é presidente do Núcleo de Estudo Luso-Brasileiro da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. O André conta-nos como tem sido a sua experiência de estar envolvido desta forma com a universidade e qual a sua visão sobre a mesma: 

Priscila Rodrigues – És um estudante envolvido com as estruturas da Faculdade. Como começou esse envolvimento e porquê? E o que te move neste momento?

André Brito – Este envolvimento começou em 2018, pouco depois de ter chegado a Portugal vindo do Brasil. Cheguei em maio, as aulas começaram em setembro e na abertura do ano letivo, na receção aos alunos internacionais, conheci o núcleo de estudos brasileiro e me interessei por aquela iniciativa. Não esperava que houvesse uma afluência tão grande de brasileiros nesta Faculdade! Fui convidado a participar nas atividades do núcleo e foi assim que iniciei o meu envolvimento. Em 2019 tomei posse como Presidente do núcleo e encarei isso como uma oportunidade de conhecer outras pessoas, conhecer outra realidade e servir os meus compatriotas que muitas vezes chegam e sentem-se extremamente perdidos, sem saber para onde ir, o que fazer, etc. Vi que havia ali uma oportunidade de serviço para os auxiliar e para, no meu mandato, implementar algumas coisas que eu não tinha recebido aquando da minha chegada e assim proporcionar uma melhor integração na Faculdade.

Depois tive uma curta participação nas eleições para a associação de estudantes em que eu fui candidato, mas a minha lista perdeu. Logo depois disso também me candidatei para entrar nos órgãos da Faculdade e fui eleito. Foi uma experiência incrível, sobretudo porque me permitiu ir além do auxílio aos alunos brasileiros, procurando auxiliar a Faculdade como um todo, observando os problemas e sugerindo soluções junto dos organismos de direção da Faculdade.

Eu diria – e repito-o todos os anos em que me candidato – que o que me move é o sentimento de serviço que nós temos como cristãos. Ainda que eu não esteja a servir os meus irmãos em Cristo, estou a servir “o meu próximo”, a usar as minhas competências para ajudar aqueles que precisam e de alguma maneira poder elevar a Faculdade que é a minha segunda casa. 

PRComo o envolvimento na AE mudou a forma como vês a Faculdade? Consegues descrever este “corpo” que é a Faculdade a partir do teu olhar de bastidores?

AB – Na AE o meu tempo foi mesmo muito curto, porque não cheguei a ser eleito. Tinha participado apenas como colaborador no mandato anterior. Mas, a partir do núcleo que eu hoje presido e no qual participo desde 2018, é interessante ver como as diversas estruturas internas da Faculdade se movem, observar por exemplo o corpo de alunos e as suas demandas específicas e como esse corpo se estrutura, observar também os professores… Muitas vezes temos de fazer concessões para negociar algum pedido junto dos professores ou então até perceber que por vezes nós alunos queremos coisas que não são possíveis. Muitas vezes é preciso discutir os assuntos por longas horas até se chegar a algum consenso e a alguma conclusão que seja boa para todos. Há diversos interesses em jogo e o meu papel é tentar organizar esses interesses para que possamos chegar a bom porto. Mas a Universidade é isto: alunos interessados em aprender e professores interessados em passar conhecimento, alunos e professores que se juntam durante um período da sua vida para viverem da melhor forma possível dentro dessa tônica. 

PR – Quais são, actualmente, os maiores desafios que o Ensino Superior, em geral, e esta Faculdade, em particular, enfrentam?

AB – Em relação ao ensino superior em Portugal, e tendo em conta o que converso com amigos de outras AE, parece-me que estamos bastante divididos e nem sempre sabemos o que queremos. Infelizmente há muitas brigas internas e há mais divisões do que necessariamente visões conjuntas entre os estudantes. 

Aqui na Faculdade de Direito eu diria que isso não muda muito, mas temos encontrado um maior contacto e disponibilidade entre todos para que possamos alcançar uma visão mais positiva, que envolva diversos setores da nossa Faculdade com diferentes pensamentos e diferentes correntes. Nos últimos tempos a Faculdade de Direito esteve muito presente na comunicação social devido às questões de assédio, mas temos tentado ultrapassar essa questão criando comissões internas e projetos implementados especificamente para que possamos erradicar este problema. Diria também que é necessário aumentar o número de acessos ao ensino superior para que seja acessível a todos os alunos para inserção num mercado de trabalho cada vez mais exigente. 

PR – Mesmo sendo o ensino público um organismo onde deve imperar a neutralidade religiosa, em que medida é que a espiritualidade cristã pode ser um tema relevante? Porquê? Em que medida é precisa ou não essa espiritualidade cristã?

AB – Eu acredito que a religião faz parte daquilo que nós somos, daquilo que contribui para o nosso caráter, e que define parte do nosso dia a dia. A Faculdade não deixa de ter uma certa relevância nesta questão. Eu diria que hoje o ambiente universitário parece muito ateísta, como se a religião e a ciência não pudessem conviver, mas isso é uma falácia. Se nós pensarmos cuidadosamente, muito daquilo que a ciência trouxe ao longo dos anos, foi desenvolvido justamente por cristãos que queriam descobrir porque é que as coisas são como são. Infelizmente hoje confunde-se um pouco aquilo que deve ser o ensino superior laico com um ensino superior ateísta. Mas como cristãos somos chamados a ser cristãos em qualquer lugar em que nós estamos. Não existe diferença entre ser cristão na igreja e ser cristão fora da igreja, muito pelo contrário. Portanto a espiritualidade cristã deve ser vivida independentemente do ambiente em que nós estejamos, faz parte de quem nós somos e precisa ser mostrada também na Faculdade. São realidades que andam juntas e cabe a nós mostrar que a ciência e a espiritualidade podem estar em harmonia.

PR – “Uma fé que pensa, uma razão que crê“ tem sido um dos lemas do GBU. Na tua opinião é desejável que a crença e o saber convivam melhor no espaço universitário ? (Se sim, como alcançar esse tipo de convívio)?

AB – Eu diria que sim e pego na minha resposta anterior: temos de realçar a possibilidade de ciência e religião andarem juntas e em Direito é fácil encontrar boas experiências nessa temática. Há grupos de investigação aqui na Faculdade que tratam sobre Direito e Religião, e também no Brasil há imensas instituições que trabalham exatamente nesse sentido, bem como na integração da fé com outras áreas do conhecimento. Eu acho que se nós avaliarmos do ponto de vista histórico vamos perceber o quanto a ciência e a religião andaram juntas para descobrir porque é que as coisas são como são. Mas hoje em dia perdemos um pouco esta perspetiva, de tal forma que se falamos de fé e ciência na Academia somos um bocado desacreditados, como se as duas coisas devessem andar completamente separadas uma da outra. Acho que nós cristãos devemos esforçar-nos mais para mostrar que estas duas esferas – ciência e fé – podem e devem caminhar juntas e uma forma de fazermos isso passa pela dedicação no estudo. É importante nós estudarmos para que aquilo que produzimos seja suficientemente bom para que a comunidade académica possa ver essa realidade da ciência e fé juntas como algo positivo.

PR – Qual a importância, na tua opinião, de um estudante cristão vivendo a sua fé em Cristo envolvido na Universidade? E como poderá ele fazê-lo considerando o pouco tempo de que dispõe?

AB – De facto tempo é algo que temos apenas em escassez. Isto é algo que aprendemos em Direito na aula de Economia I : que o tempo é um bem muito escasso. Também me lembro de aprender sobre mordomia na igreja e a mordomia deve incluir tudo aquilo que diz respeito à gestão do tempo. Porque, de facto, participar nos órgãos da Universidade é uma atividade que requer muito tempo. Tempo que muitas vezes acaba por ser retirado dos estudos – comigo é assim e sei que com outros colegas é idêntico. 

Mas temos de aprender a gerir esta área, sobretudo porque acho mesmo importante nós participarmos desta forma na vida universitária porque, como cristãos, somos chamados a isso. Encontramos nas Escrituras muitos exemplos de pessoas que lideraram e que, por meio da sua liderança, e com a direção de Deus, contribuíram para que a comunidade fosse abençoada. Isso nos mostra que temos a possibilidade de abençoar a Faculdade por meio da nossa participação nela. 

Nos media vemos notícias de corrupção, má gestão dos dinheiros públicos, etc, e nós cristãos podemos fazer a diferença nestas situações, porque nós buscamos sempre a excelência para a glória de Deus. Sabemos que nem sempre o conseguimos fazer, mas este deve ser o nosso mote. Somos imperfeitos, sabemos que vamos falhar, mas isso não deve impedir de colocarmos o nosso tempo à disposição de Deus, ajudando o nosso próximo, os nossos colegas da Faculdade e os nossos professores, quer seja através dos órgãos da Faculdade ou das associações de estudantes.

O serviço tem sido sempre o que me tem movido apesar de que nem sempre tenho conseguido gerir bem o meu tempo; esta é de facto uma luta diária para mim. Não obstante, devemos procurar glorificar a Deus em todas as áreas, incluindo na gestão do tempo. 

André Brito, estudante de Direito da Universidade de Lisboa, membro do Conselho de Escola da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e do Senado da Universidade de Lisboa, e Presidente do Núcleo de Estudo Luso-Brasileiro da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.
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